quinta-feira, 25 de setembro de 2014

VIDA E OBRA DE JAN HUSS

João Huss (1369-1415)
Enquanto Wycliffe enfrentava as autoridades eclesiásticas na Inglaterra, Huss era o responsável pelo movimento pré-reformador na Boêmia, parte do que atualmente é a Tchecoslováquia, ligada naquele tempo ao império Alemão. Tanto na Boêmia de Huss quanto na Europa de Wycliffe, uma reforma eclesiástica era necessária, pois a simonia, a pompa dos prelados e a corrupção moral eram comuns. Gonzáles acredita que metade do território nacional estava em poder da igreja, enquanto a coroa possuía uma sexta parte.
Durante estes anos, muitas das ideias de Wycliffe influenciaram Huss, especialmente aquelas que diziam respeito à espiritualidade da igreja. Huss, entretanto, não era exclusivamente um produto da teologia de Wycliffe, porque teólogos tchecos anteriores, tais como Mateus de Janov, também deram forma ao desenvolvimento teológico de Huss. É possível que Conrado de Waldhausen tenha influenciado mais a Huss do que a Wycliffe. Conrado foi um dos grandes pregadores do movimento pré-reforma na Boêmia, obtendo um grande número de discípulos, e é possível traçar uma linha de sucessão ininterrupta entre ele e o mais famoso dos reformadores boêmios, João Huss. Por esta razão, apesar de ser verdade que as ideias de Wycliffe encontraram eco nas de Huss, afirma Gonzáles que isto não deve ser exagerado ao ponto de fazer do reformador boêmio um mero discípulo do inglês.
Huss nasceu na aldeia de Husinec, no sul da Boêmia. Estudou na Universidade de Praga e, em 1398, juntou-se ao corpo docente da Faculdade de Letras, como preletor. Além disso, fez os votos de sacerdote. Durante estes anos passou pela conversão, embora não sejam claros os pormenores. Passados alguns anos, Huss foi nomeado reitor e pregador na capela de Belém, em Praga, o centro do movimento da reforma tcheca, em 1402. Ali ele pregou com dedicação a reforma que tantos outros tchecos propugnavam desde os tempos de Carlos IV.
Os sermões de Huss atacavam os abusos dos clérigos, especialmente a imoralidade e a luxúria do clero. Sua teologia era uma mistura de doutrinas evangélicas e católico-romanas tradicionais. Huss pregava contra a veneração do papa, ressaltando uma forte fé cristocêntrica que enfatizava a responsabilidade do indivíduo diante de Deus. Acreditava que somente Cristo podia perdoar os pecados e esperava um dia de juízo vindouro. Enfatizava a pregação da Palavra de Deus para a realização de uma transformação moral e espiritual na vida de seus ouvintes. Sua eloquência e fervor eram tamanhos que, em pouco tempo, aquela capela se transformou no centro do movimento reformador. Sua ousadia na palavra era absolutamente notável, tanto que, Venceslau IV, rei da Boêmia, e sua esposa, a rainha Sofia, o acolheram por seu confessor, e lhe deram o seu apoio.
Não devemos pensar que a nobreza olhava Huss com os olhos do rei, porquanto alguns o encaravam com receio. Ao mesmo tempo em que pregava contra os abusos que havia na igreja, Huss continuava sustentando as doutrinas geralmente aceitas, e nem mesmo seus piores inimigos se atreviam a censurar a sua vida ou sua ortodoxia. As pregações e ensinos de Huss exalavam a mensagem dos reformadores, tanto que em 1407, já era identificado com os reformadores.
Como teólogo, Huss ajudou a restaurar uma visão bíblica da igreja, visão esta que se concentrava nos ensinos de Cristo e no seu exemplo de pureza. Além disso, sua ênfase na pregação e no sacerdócio universal dos crentes veio a ser marca distintiva da Reforma protestante posterior. Incentivou também o cântico de hinos congregacionais, muitos dos quais eram de sua autoria. Para os tchecos, Huss não foi apenas um líder espiritual, mas também um ponto central de inspiração nacional nos séculos posteriores à sua morte.
Em 1409, o Papa Alexandre V autorizou o arcebispo de Praga a erradicar a heresia na sua diocese. Quando o arcebispo pediu que Huss deixasse de pregar, ele se recusou e foi excomungado em 1410. Huss, de igual modo, continuou a pregar contra a política e autoridades papais.
Em 1411, quando o Papa de Roma, João XXIII, homem de vida dissoluta e hábitos guerreiros, proclamou uma cruzada contra Ladislau, rei de Nápoles, e ofereceu em troca as indulgências a todos aqueles que se reunissem ao exército papal, Huss se opôs severamente. Vinte anos antes tinha comprado uma indulgência, mas agora transformado, havia mudado de opinião, protestando contra esse duplo abuso, ou seja, o de vender indulgências e o de proclamar uma cruzada contra outros cristãos. O povo, encantado com sua eloquência, recusou a receber os missionários do Papa. Estes revidaram, assassinando sorrateiramente três líderes que se opunham à cruzada. Huss, prevendo as consequências retirou-se para o sul da Boêmia, a fim de ensinar e pregar. Foi citado pelo Papa para comparecer perante o tribunal do Vaticano, mas ignorou a intimação, sendo por esse motivo, excomungado.
Em 1414, com a promessa de salvo-conduto, Huss viajou para o Concílio de Constança. Um salvo-conduto representava para Huss que ele corria perigo. Mas Huss não desejava perder a oportunidade de pregar a reforma. Como estava cônscio de que compareceria diante de João XXIII e de sua cúria, antes de partir deixou um documento que deveria ser lido no caso de sua morte. Seu caráter e devoção eram extraordinários. Afirmava, neste documento, que seu pecado, imagine, era jogar xadrez!
Huss foi recebido por João XXIII com cortesia, e este chamou o reformador para o consistório. Huss insistiu com o Papa que estava ali para expor sua fé diante do concílio e não em um recinto privado. Ali mesmo Huss foi formalmente acusado de herege. Não aceitou a acusação e respondeu que preferia morrer do que ser herege, e que o convencessem, pelas Escrituras, de que o era; caso fosse, retratar-se-ia.
No dia 5 de junho de 1415, Huss compareceu diante do concílio e fora levado para a assembleia acorrentado. Novamente foi acusado de herege e de seguir as doutrinas de Wycliffe. O reformador concordou que tinha dito que “Wycliffe era um verdadeiro crente, e que sua alma estava agora no Céu, e que não podia desejar maior salvação para a sua própria alma do que a que estava gozando a alma de Wycliffe”. Huss tentou, sem sucesso, expor suas opiniões. O processo de Huss durou mais de três dias. O salvo-conduto do Imperador foi retirado, quando este cedeu aos clamores dos algozes do reformador. O concílio continuava pedindo que Huss se submetesse a ele, retratando-se de suas doutrinas. Mas o próprio concílio recusava-se a ouvir quais eram as doutrinas de que Huss era acusado de ensinar e pelas quais ele estava sendo julgado. O cardeal Zabarella preparou um documento no qual exigia que Huss se retratasse de seus erros e aceitasse a autoridade do concílio.
A resposta de Huss, foi firme: “Apelo a Jesus Cristo, o único Juiz Todo-Poderoso e totalmente justo. Em suas mãos eu deponho a minha causa, pois Ele há de julgar cada um, não com base em testemunhos falsos e concílios errados, mas na verdade e justiça”.
Por vários dias o deixaram encarcerado numa masmorra úmida e imunda, e com pouco alimento. Com este tratamento esperavam diminuir-lhe a força, e poderem fazer dele o que quisessem. Huss ficou gravemente doente enquanto esteve na masmorra. Muitos foram visitá-lo, pedindo-lhe que se retratasse, mas Huss continuou firme. No dia 6 de julho de 1415, Huss foi levado para a catedral de Constança. Ali, depois de um sermão sobre a teimosia dos hereges, pregado pelo bispo Lodi, sobre o tema “Para que o corpo do pecado seja desfeito” (Rm 6.6), ele foi vestido de sacerdote e recebeu o cálice, somente para que, em seguida, lhe arrebatassem a ambos, em sinal de que estava perdendo suas ordens sacerdotais. Tomaram o cálice de suas mãos, dizendo: 
“Maldito Judas que, tendo abandonado o conselho da paz, entraste no dos judeus, arrancamos-te das mãos este santo cálix onde está o sangue de Cristo”. “Pelo contrário”, disse Huss numa voz forte, “confio que pela graça de Deus ainda hoje hei de beber dele no seu reino”. Os bispos retorquiram então: “Nós entregamos a tua alma aos demônios do inferno”, ao que Huss respondeu: “E eu entrego o meu espírito em tuas mãos, ó Senhor Jesus Cristo; a ti entrego a alma que tu salvaste!”.
Depois lhe cortaram o cabelo para estragar a tonsura, fazendo-lhe uma cruz na cabeça. Por último, lhe colocaram na cabeça uma coroa de papel decorada com três demônios e o enviaram para a fogueira. A caminho do suplício, ele teve que passar por uma pira onde ardiam seus livros.
Mais uma vez lhe pediram que se retratasse, e mais uma vez ele negou com firmeza. Chegado ao lugar de execução, não lhe foi permitido falar ao povo, mas a oração que fez enquanto estava sendo amarrando ao poste chegou ao ouvido de todos, dizendo: “Senhor Jesus, por ti sofro com paciência esta morte cruel. Rogo-Te que tenhas misericórdia dos meus inimigos”. No último momento ainda fizeram uma tentativa para o induzir a assinar uma retratação, mas não conseguiram:
“Tudo o que escrevi e assinei foi com o fim de livrar as almas do poder do demônio, e livrá-las da tirania do pecado; e sinto alegria em selar com o meu sangue o que escrevi e assinei”. Após essa oração acenderam a fogueira. Mas o sofrimento do mártir acabara depressa. Enquanto ainda orava a Deus decaiu-lhe a cabeça sobre o peito e uma nuvem de fumaça o sufocou. Assim, João Huss, que tinha dado uma boa confissão, obteve a coroa do martírio e partiu para estar com Cristo.
Segundo a tradição, momentos antes de morrer ele proferiu as seguintes palavras:
“Hoje vocês estão matando um ganso, mas daqui a cem anos Deus levantará um cisne, o qual vocês não poderão matá-lo.”
Muitos interpretaram esta frase como sendo uma profecia em alusão ao reformador Martinho Lutero, que cem anos depois viria nascer e ser usado por Deus na gloriosa reforma religiosa.

Fonte: CPAD NEWS - COLUNISTAS
Pastor Esdras Bentho


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